Temos acompanhado perplexos o massacre que estão tentando fazer contra uma das mais importantes ferramentas de inclusão educacional do Brasil: a Educação a Distância (EAD). De repente, o Ministério da Educação (MEC) resolve demonizar o instrumento que incluiu milhões de pessoas no ensino superior, e justamente aquelas que emergiram das classes sociais menos favorecidas. E o mais irônico é que este massacre está sendo realizado justamente por um governo socialista, que prioriza, ou deveria priorizar, os cidadãos brasileiros mais pobres.
A resposta da sociedade brasileira deve ser por meio da Consulta Pública que o próprio MEC publicou no dia 19 de outubro deste ano, com prazo de encerramento das submissões até 20 de novembro de 2023.
Se você é contrário à proibição de 16 cursos de graduação na modalidade de EAD e uma série de outros lastimáveis equívocos que o MEC está cometendo sobre esta importante modalidade de ensino, leia este artigo na íntegra e entenda como você pode contribuir com sua opinião nesta Consulta Pública.
Por David Stephen
No dia 19 de outubro, motivado por uma rasa interpretação de números provenientes do Censo da Educação Superior de 2022, o Ministério da Educação resolveu abrir consulta pública para a sociedade opinar sobre a remoção de uma série de cursos de graduação da modalidade de EAD (Educação a Distância) sob o pretexto de que este método de ensino é o responsável pela má formação de profissionais, segundo o resultado do ENADE – Exame Nacional da Educação Superior.
O equívoco da análise
Realmente o resultado dos concluintes dos cursos de graduação a distância são inferiores aos dos cursos presenciais equivalentes, no entanto, esqueceram de considerar o nível dos ingressantes dessa modalidade de ensino. Em outras palavras, os alunos que optaram pela EAD assim o fizeram, em sua maioria, porque apresentam um perfil diferente daqueles que optaram pelo ensino presencial.
Os estudantes da EAD são, via de regra, aqueles mais sacrificados, que precisam trabalhar para pagar seus estudos, e que já ingressaram na instituição de ensino superior bastante defasados em relação ao nível dos estudantes recém formados no ensino médio. Estes sim, por terem mais tempo para se dedicarem aos estudos, puderam optar pelo ensino presencial.
Ora, ao invés de comparar banana com banana e laranja com laranja, os analistas do MEC optaram por comparar frutas diferentes com um mesmo critério, o que significa um vício de origem na base da pesquisa científica, como bem disse o Prof. Paulo Milet em um artigo escrito recentemente aqui mesmo no blog da Editora TeleSapiens. Para ler ou reler este artigo, acesse este link.
Os fatos
Ao contrário do que pensam os técnicos do MEC, o Brasil é reconhecidamente o país que detém uma das melhores tecnologias do mundo em termos de educação a distância. Desde a década de 1990, quando a Internet comercial teve início no país, universidades, escolas e empresas começaram a desenvolver mecanismos tecnológicos de ponta para levar educação para todos em todos os lugares. Nós mesmos, da Editora TeleSapiens, fomos um dos pioneiros no sistema telepresencial de ensino conectado via satélite na primeira década deste milênio.
Atualmente, não é por acaso que a grande maioria dos estudantes brasileiros optam pelo método de EAD, pois encontram nesta modalidade a viabilidade econômica e operacional de se formarem e poderem atuar em suas profissões. Na última década deste século, a busca por esta modalidade superou todas as expectativas, impulsionada, sobretudo, pela pandemia, que veio desmistificar esta modalidade de ensino que fomenta a autoaprendizagem, uma soft skill importantíssima para todo e qualquer profissional.
A verdadeira motivação
Por que será que, de repente, há tanta pressão sobre este método de ensino, justamente no momento em que boa parte dos grandes grupos econômicos do mercado educacional agonizam com suas ações em queda livre e a crescente ociosidade em suas milhares de salas de aula espalhadas pelo Brasil?
Haveria algo dando errado no ensino presencial dessas instituições de ensino?
Será que não está havendo um movimento de salvamento dessas instituições, assim como houve com os bancos nas décadas de 1980 e 1990?
Por que se discute tanto a modalidade de EAD em cursos como psicologia e direito, enquanto pouco se fala em outros cursos que realmente necessitam de carga horária presencial para as práticas laboratoriais, como as engenharias, por exemplo?
Será que dificultando o progresso da EAD, que já se consolidou no mundo inteiro, o MEC acha mesmo que vai melhorar a qualidade do ensino superior no Brasil?
O fato é que a explosão da EAD, chegando a bater mais de 70% das matrículas no ensino superior em todo país, vem incomodando muita gente que não enxerga nesta modalidade a solução, ao invés de o problema, para a melhoria da qualidade do ensino superior no Brasil.
A consulta pública
O Ministério da Educação formulou seis questionamentos à população, estranhamente requerendo respostas subjetivas, como se fosse humanamente possível analisar cada uma das milhões de respostas que certamente haverá para essas perguntas. Mas, supondo que eles realmente consigam esta façanha, reunimos essas indagações a seguir, com nossos comentários logo em seguida:
- A aprovação de pedidos de credenciamento ou de recredenciamento para oferta de cursos na modalidade de educação a distância – EaD terá a exigência de Conceito Institucional para EaD – CI-EaD majorada de 3 (três) para 4 (quatro).
COMENTÁRIO: Aqui vemos claramente um equívoco recorrente nos órgãos de regulação do Brasil, que sempre recorrem a indicadores medianos para avaliarem conjuntos complexos de elementos como são os que compõem o sistema de avaliação de uma instituição de ensino. Observe que o CI é composto por diversos outros indicadores que medem especificamente vários fatores inerentes à qualidade de ensino de um projeto pedagógico. Assim, ao invés de se buscarem ajustar os indicadores específicos da EAD, eles buscaram elevar o indicador final como se ele fosse, sozinho, capaz de avaliar o desempenho do ensino-aprendizagem a distância de um projeto pedagógico. Simplesmente elevando esta régua, o MEC passará por cima de inúmeras peculiaridades a respeito de, por exemplo, a forma como o aluno é avaliado, a infraestrutura disponível, a plataforma de aprendizagem, o conteúdo didático, entre inúmeros outros elementos que poderiam ser ajustados para a melhoria do conjunto.
- Instituições de Educação Superior – IES que tiverem o recredenciamento indeferido por não atingirem no mínimo CI-EaD igual a 4 (quatro) só poderão protocolar novo pedido de credenciamento para a modalidade EaD após 2 (dois) anos, a partir da data de publicação da portaria de indeferimento do recredenciamento.
COMENTÁRIO: Nas entrelinhas desta proposição vê-se claramente a preocupação de frear a expansão da educação a distância no Brasil, literalmente puxando o freio de mão para remeter nosso país a mais um atraso em relação a outros países. Será que o MEC acha mesmo que retardando essa expansão vai conseguir melhorar a qualidade do ensino superior a distância? Ou será que isto vai desestimular novas iniciativas de oferta da EAD e, desse modo, reduzir a oferta dessa modalidade, elevando ainda mais os índices de desemprego e subemprego para os brasileiros? Para realmente se trabalhar o problema da qualidade no ensino superior a distância, que certamente existe (mas não só nesta modalidade), o MEC precisa rever os instrumentos de avaliação em detalhes.
- As Instituições de Educação Superior – IES que obtiverem CI-EaD menor que 4 (quatro) em seu processo de recredenciamento ficam proibidas de abrir novas turmas, perdendo seu credenciamento para a modalidade EaD quando concluídas as turmas existentes.
COMENTÁRIO: Esta proposição expõe o lado mais obscuro da filosofia doutrinária de nossa legislação – a Lei que pune e mata o mensageiro. Assim como preconizado por grandes educadores, os processos avaliativos devem servir para educar, e não para punir. Muitas instituições que obtêm baixos indicadores se esforçam por melhorarem seus desempenhos de forma contínua. Será que este método punitivo e inibidor do crescimento contribui mesmo para esta melhoria, ou será que ele representa uma pá de cal nas já sufocadas IES que não aguentam mais o peso de um regulatório extremamente burocrático e contraproducente?
- Cursos de graduação só poderão ser autorizados e ofertados na modalidade EaD se a carga horária mínima exigida para as atividades práticas, estágio curricular, atividades de extensão e outros componentes ou atividades curriculares expressamente designados pelas DCNs como obrigatoriamente presenciais não alcançar, conjuntamente, 30% da carga horária total do curso.
COMENTÁRIO: Mais uma vez vê-se claramente que os técnicos que propuseram esses questionamentos não entendem que a presencialidade na EAD não necessariamente representa melhoria da qualidade do ensino. Fazer o aluno gastar mais dinheiro com ônibus e metrô para fazer aquilo que ele poderia fazer de casa não vai ajudar este aluno, mas sim elevar ainda mais a probabilidade de evasão. Afinal, esqueceram de que a modalidade escolhida por ele foi a de EAD, e não a presencial. A solução para a melhoria da qualidade do ensino a distância a distância para esses casos seria, inequivocamente, a exigência das práticas laboratoriais e demais atividades que, realmente, necessitem ser realizadas presencialmente, e não a fixação de um percentual arbitrário. Alguns cursos como os da área de engenharia e saúde poderão até mesmo chegar a mais de 30% de presencialidade, mas isto não pode ser generalizado para todos os cursos.
- A aplicação dessa exigência de 30% de atividades presenciais implicaria na proibição da oferta dos cursos de Direito, Enfermagem, Odontologia e Psicologia e de outros 12 (doze) cursos na modalidade EaD: Biomedicina, Ciências da Religião, Educação Física (bacharelado), Farmácia, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Geologia/Engenharia Geológica, Medicina, Nutrição, Oceanografia, Saúde Coletiva e Terapia Ocupacional.
COMENTÁRIO: É definitivamente desafiador entender o porquê da proibição de cursos que não exigem práticas laboratoriais como Direito, Psicologia e Ciências da Religião, e ao mesmo tempo, a permissão de cursos como Engenharia Civil, Estética e Cosmética, entre outros cursos baseados na prática hands-on. Existem métodos alternativos como o uso de laboratórios móveis, óculos de realidade virtual e outros recursos que viabilizam perfeitamente as práticas laboratoriais imersivas aos alunos, muitas vezes de forma mais eficiente do que em ambientes sucateados aos quais são submetidos estudantes em muitas das instituições de ensino presenciais. Mais uma vez fica claro que a real motivação dessas proibições não tem nada a ver com qualidade de ensino, mas sim com o atendimento a interesses corporativos ou de classes específicas de profissionais preocupados em frear o ingresso de novos profissionais. A impressão é que essas proibições escondem o medo da concorrência entre eles. No final, a conta é paga pela população, que fica desassistida pela falta de profissionais de saúde e de outras áreas essenciais para suprir a necessidade do mercado de trabalho.
- As instituições de Educação Superior – IES com cursos na modalidade EaD afetados pela exigência de 30% de presencialidade têm até 6 (seis) meses para registrar novos ingressantes, ao final dos quais não poderão mais matricular novos estudantes, devendo apenas manter as turmas em andamento, pelo prazo que for necessário para que todas as pessoas matriculadas encerrem suas matrículas, ou por conclusão, ou por trancamento de livre e espontânea vontade.
COMENTÁRIO: Mais uma vez se vê, nas entrelinhas, a preocupação de se frear a evolução da EAD, ou, como poderíamos melhor dizer, a escalada de oportunidades de estudo e trabalho para novos profissionais. Esquecem os tecnocratas do MEC que existe um princípio denominado: direito adquirido. O poder público não pode, a seu bel prazer, revogar uma autorização de curso que foi concedida por um prazo determinado. Essa proposição certamente não terá sustentação jurídica e sucumbirá aos muito mandados de segurança e ações cautelares impetradas contra o Estado, onerando mais e mais os cofres públicos.
Concluindo, engana-se o Ministério da Educação ao tentar imputar a uma modalidade de ensino anos e anos de descaso com a educação básica dos brasileiros, denunciado pelos péssimos indicadores do PISA. O Brasil amarga as piores colocações mundiais quando se trata do desempenho escolar de seus estudantes. Mas ao que parece, o MEC ignora isto e tenta transferir a responsabilidade do fracasso da educação brasileira para o ensino superior a distância, que se tornou o bode expiatório desta vez.
Esperamos sinceramente que esta consulta pública seja respondida por milhões de brasileiros realmente interessados em democratizar o ensino superior para todos, em todos os lugares, assim como é o nosso propósito, e o de muitas instituições e organizações que lutam há bastante tempo por uma educação melhor para as próximas gerações.
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Interessante é que no Ensino Médio, me refiro aqui no Paraná, há uma avalanche de atividades por meio de plataformas virtuais, que de certa forma pode também ser considerado um meio de EAD. Sendo essas práticas exageradamente forçadas pelo Governo como forma de melhorar a qualidade do Ensino. Então porque, na Educação Básica isso é importante e no Ensino Superior passa a não ser tão relevante essa metodologia de Ensino?
Tens toda razão Celso!
Não há uma só lógica nas ações deste governo.
Vamos aguardar as cenas dos próximos capítulos.
As dificuldades interpostas ao EAD e as expressões do atual ministro da educação são claramente de viés político e zelam por estruturas educacionais engessadas, resguardando o interesse de capitalistas que possuem investimentos nas IES da modalidade presencial. Na IES em que atuo (Universidade do Oeste Paulista-UNOESTE), os resultados do ENADE dos estudantes do EAD mostraram um desempenho superior se comparados aos dos estudantes da modalidade presencial da mesma instituição em praticamente todos os cursos (esse foi o resultado do primeiro ENADE que fizemos pelos cursos em EAD, em contraponto com cursos particulares que realizaram mais de uma dezena dessas provas, possuindo grande Curva de Experiência no assunto). Assim, resta evidente que a qualidade do ensino não se define pela modalidade, pois um trabalho bem feito trará resultados positivos, quer seja pelo EAD ou pelo ensino presencial.
É necessário fiscalizar os cursos e alinhar as diretrizes educacionais à realidade do mercado (e a própria avaliação do ENADE, diga-se de passagem) e nesse ponto, o INEP/MEC tem falhado, especialmente nos processos de reconhecimento dos cursos em EAD, pois nesses processos, assistimos o trabalho de comissões movidas por preconceitos e desconhecimento dos avaliadores sobre o que é o EAD.
Nesse condão, não é o caso de castrar a expansão do EAD, mas sim, o de revisar o processo, as diretrizes curriculares e reconhecer as falhas, trabalhando com conduta suprapartidária e ética, orientada para a defesa da democratização do acesso ao ensino superior de qualidade no Brasil.
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Celso, muito bem colocado!
Já perdemos as contas da quantidade de controvérsias geradas por esse governo no que tange à pasta da Educação. Já batemos na tecla de que estamos em pleno retrocesso na educação superior com esse protecionismo fisiológico, entre outras! Vamos aguardar as cenas dos próximos capítulos deste seriado de terror contra a melhor EaD do mundo: a EaD Brasileira!
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